sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

O espetáculo

Compartilhando sonhos.
Numa mistura de O Palhaço, Capitu com as escolas ao som de Beirut, Orquestra Voadora e Banda Marcial Marista,  meu sonho dessa noite foi uma delícia. Por isso, resolvi compartilha-lo na integra correndo o perigo de não fazer o menor sentido, mas irie copiá-lo como está no caderno dos sonhos.

31.01.14.
O local parecia como um pequeno casarão, com uma grande sala no centro de um espaço em formato da letra U e com dois andares.
O espetáculo era simples e sincero, todos os artistas que eram também plateia estavam espalhados pelos corredores, nos andares para observar o número do centro.
Os músicos maquiados como num circo eram brincalhões e estavam em todo lugar; uma tuba ali, uma sanfona aqui, a precursão era tudo aquilo que fazia som. Trompetes e trombones, flautas e até mesmo um belíssimo piado de cauda no segundo andar próximo a escadaria.
Do alto do teto dois amantes em um único tecido faziam piruetas e encantavam ao público. Corpos perfeitos e maquiagem brilhante.
O número do centro é das crianças douradas orquestradas pelos maestros Chico (de espanhol) e Leo (do circo) que com suas batutas e apitos harmonizavam a dança. De todos os lugares, crianças planam com roupas douradas que refletem luz para todo o pequeno espaço. Parecem pequenos budas a levitar.
Meu número é o próximo, coloco minha cartola, arrumo minha gravata e meu chicote e vou ao centro apresentar o Simba, um filhote de leão feroz para a plateia mas dócil como um gato. Minha performance está entre o perigo (falso) e o riso. Minha ajudante é a bela e ruiva Thyane. Simba está sentado ameaçadoramente, então ordeno que ele solte um rugido que espantasse as multidões do mundo, ele lambe meu rosto e todos riem. Nova tentativa, rufam os tambores, dou a ordem, estalo o chicote no ar e ele se deita com a barriga para cima pedindo carinho, novas risadas da plateia. É então que ele se senta, olhando para Thyane e para mim diretamente, percebe meu comando e antes mesmo do fim das risadas solta um belo rugido. Do público saem gritos assustados, mas em seguidas as palmas para Simba o filhote feroz.
Próximo número, as dançarinas exóticas com fogo e espadas. As belas meninas passam por mim e entram no palco com suas velas e incensos acesos, o tom da banda muda para algo mais intenso, de suspense, a luz escure e então uma das meninas cospe fogo na multidão, susto e aplausos.
Olho para tudo, feliz com o resultado. Olho no próximo andar e vejo Jônio e Nagui se preparando para o número de contorcionismo, dessa vez ela vai dentro da caixa como uma boneca de pano.
Vejo a Lara dançando, linda no palco, com suas laminas, velas e veus. Continuo a olhar ao centro e vejo meus bons amigos Lu e Digão entrelaçados nos tecidos que caem do teto. Ao fundo estão a Biboca, o Fabio e a Dê fotografando e filmando tudo. A Banda é claro, todos os músicos são os da banda de Brasília do Marista com a adição de uns camaradas listrados nos instrumentos de cordas.
Olho para tudo e fico feliz com nosso espetáculo.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

O dilema


Esses dias eu estava lendo um texto do Luís Fernando Veríssimo chamado ‘A Primeira’, texto esse do livro Literatura & Futebol organizado pela Revista Bravo. Bem interessante o livrinho, reúne grandes nomes da literatura brasileira, do Romântico Drummond e seu amor pelo futebol mineiro (mesmo sendo ele Vascaíno) a Ucraniana Carioca Clarice Lispector , todos envoltos na temática futebol.

Veríssimo, sempre saudoso em suas divertidas crônicas conta a experiência vivida por ele no belíssimo momento entre o ganhar uma bola nova e o primeiro chute e toda a gama de sensações e sentimentos que isso trazia a tona da cabeça de uma criança durante a infância dele.

“ Hesitava-se muito antes de dar o primeiro chute na bola nova (...) Era um dilema, você não conseguia resistir ao impulso de levar a bola para a calçada e começar a narrar seus próprios movimentos com ela como um locutor entusiasmado (...) e ao mesmo tempo queria prolongar ao máximo aquela sensação de couro novo, intocado, nas mãos”

Pois bem, algo próximo a esse dilema pessoal me ocorreu hoje, mas no meu caso, a primeira remada no asfalto. Mas antes, assim como Veríssimo, voltarei aos dias de minhas infância, pelo menos ao momento histórico dela, já que a sensação já foi vivida minutos atrás.

Em minha infância, não fui uma criança muito comum, ou pelo menos, era o que eu achava naquela época. Filho único de pais jovens e separados, vivi boa parte de meus anos iniciais na casa de meus avós maternos, estudava em uma ótima escola, (sendo neto de mineiros católicos e militares, estudei a vida toda na congregação Marista, os quais vivi meus melhores e piores anos da vida).
Ao contrário dos demais meninos, quando o badalo do recreio batia, andava calmamente para o pátio sem o menor interesse de pegar o campinho ou o melhor golzinho da escola e, ainda, para o espanto de todos, não tinha um time de preferência para me nutrir futuros ataques cardíacos ou no caso escolar para insultar meus demais colegas, dizia (assim como digo até hoje) que era do Atlético Mineiro (time de boa parte da família materna) ou Vascaíno (time da família paterna) dependendo de quem estivesse melhor, mas nunca soube nenhum técnico ou grande jogador de nenhum deles.

Meu tio até chegou a ter aquela conversinha comigo, imagino eu que preocupado de me tornar o “primo gay” da família, pois para os padrões maniqueístas dele não era possível não jogar bola, não ter time e ainda por cima, gostar de jogar queimada. No país do futebol é lei, nasceu menino, vai ser astro do futebol, mas meu estrelato com nos gramados verdes estava cada vez mais distante.

Me lembro bem na Copa de 94, o único momento em que o futebol me agradava, cometi a gafe clássica perante toda a família – mas por que ninguém toca para aquele de preto? Ele fica ali pedindo a bola com o apito e ninguém passa pra ele – eis que o mundo de minha família desmoronou, o único neto, não sabia nem mesmo diferenciar quem era o juiz em campo. Acho que ali ficou claro, eu seria O primo gay da família.

Os anos passaram, eu continuei a não gostar de futebol,tão pouco de meninos, mas era craque em pique e esconde e policia e ladrão, devido a minha pequena estatura e magreza conseguia escalar facilmente arvores ou me esconder em lugares minúsculos. Na hora de escolher os times, era sempre o primeiro a ser escolhido, ao contrário, lógico, do futebol na escola (obrigatório nas aulas de Ed. Física).

Como toda criança, eu também tinha meus panteon do esporte: 
Sandro Dias, o Mineirinho era o meu preferido, também de família mineira, também pequeno, mas com um skate no pé eles desbancava todos os gigantes. Além do Mineirinho, eu sempre acompanhava (do verbo, comprava os VHS dos X-games e assistia uma centena de vezes) um cara novo chamado Chris Charma, que se tornaria em poucos anos o melhor escalador que já existiu.

Meu sonho era ser estiloso como Bob Burnquist, até fui as lojas de skate comprar calças largar (sim, naquele tempo, skatista usava calça larga, bem larga) para ver se melhorava, mas a habilidade nos pés não vinha de brinde, no máximo, quando o jeans já estivesse rasgado de tanto cair, um básico oli e quem sabe um varial  flip de base invertida, mas aí já era para os profissionais, ou os prós como costumávamos dizer.

Pronto, o “problema familiar” está resolvido, o garoto (no caso eu) gosta é de skate – disse meu tio com um sorriso no rosto. E lá se foi toda a família comprar um skate novo para a criança, mas principalmente, para manter o status de família padrão. Nunca vi tamanha mobilização para me dar um presente. O mais engraçado disso tudo foi ver o Brigadeiro Sobreira e sua esposa (também conhecidos como avô e avó) indo comigo para o submundo da capital federal em busca do tão sonhado skate.

- Mas você tem certeza que é por aqui meu filho? Perguntava meu avô horrorizado com os trajes dos frequentadores do lugar – veja meu filho, alguns deles tem até tatuagem, isso não é gente muito correta sabe, não é melhor comprar esse seu skate lá no shopping, eu vi uns lá bem bonitos?

- Não vô, aqui são os melhores, aqueles lá são para crianças – disse eu do auge dos meus onze anos de idade – podexá que o pessoal aqui é tranquilo, venho sempre aqui comprar revistinhas.
Antes que meu avô entrasse em mais uma discussão moral sobre as vestimentas alheias, o puxei para a loja e já fui montando meu skate. Fun House era o nome da loja e Ferrugem era o vendedor (o mesmo Ferrugem que viria a se tornar um grande skatista no final dos anos 90). Escolhe shape – ta quanto o Santa Cruz Ferrugem?

- Ih garoto, ta caro viu, nem o Burnquist usa um desses.

- Poutz, deixa então, vou de nacional mesmo, me passa aquele ali vermelho (para auxiliar no horror de minha avó catolica, o desenho do shape era de uma demonio assediando uma magnifica loira)

Truque escolhido e aparafusado, rolamentos em perfeita ordem, rodinhas novas, lixa com um corte para identificar o tail, tudo colocado em perfeita ordem e pronto pra uso e é então que o momento mágico acontece, milhoes de pensamentos passam por minha cabeça e entre eles a não vontade de colocar o skate no chão para não arranhar nada. Em minha mente, eu desejava com todo o meu ser ter esse mesmo skate todo ralado, mas ele é novo, seu truque arranhado de tantos corrimões que desceria, mas ele é novo, sua lixa trocada de tão gasta, mas ele é novo, seu shape lascado dos vários saltos e consequemtemente tombos, mas ele é novo.

Foi então que num fechar de olhos, joguei o skate no chão e pulei em cima dele, o coraçao a mil, como é lindo esse som da rodinha no asfalto, ouço os outros próximos, o barulho da madeira tocando o chão da descida do salto, arrisco um eu mesmo, o resultado é claro, skate para um lado e eu de costas no chão, rindo e passando a mão na bunda pela dor na queda.

Toda essa história foi para contar que hoje eu comprei um skate novo, depois de mais de uma década sem pisar em um, comprei um long é claro, não tenho mais os joelhos dos meus treze anos, mas o dilema vivido em minha infancia foi o mesmo. As rodinhas brancas em pouco tempo se tornaram marrom e minhas pernas estão um pouco doloridas, mas pouco importa, lá estava eu, novamente, deslizando pelo calçadão de Ipanema.

Veríssimo termina seu texto dizendo que “correr atrás da bola é o que todos nós continuamos fazendo, tamanhos homens, até hoje. E continua bom.” Cada qual com seu James Brow, mas realmente Veríssimo, continua muito bom


Bob  Burnquist

Sandro Dias, o Mineirinho

Chris Charma

Calçadão de Copacabana

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Cidade Maravilhosa


Próxima parada: Rio de Janeiro, a Cidade Maravilhosa.

Popular em todo o planeta por suas belas praias, mulheres e noitadas a cidade maravilhosa é e eternamente será digna do clichê “o Rio de Janeiro continua lindo”. Realmente essa cidade é linda, mobilidade ótima, metrô a cada 5 minutos que leva para todos os lugares da cidade com apenas uma passagem, NO QUAL OS ESTUDANTES DE ESCOLAS PÚBLICAS NÃO PAGAM, faixas exclusivas para os ônibus diminuindo o transito, além o incetivo ao uso de recursos sustentáveis como bicicletas a baixíssimo custo (10,00 por mês) e ciclovias que cortam boa parte do acesso as praias, locais de comum congestionamento durante a estação do verão.

As pessoas andam na rua sorrindo e fazendo brincadeiras um com os outros. Costume esse muito interessante da população carioca, a interação gratuita. Estar numa fila de super mercado, no ponto de ônibus ou mesmo no banheiro de uma festa é certeza que alguém irá puxar papo contigo aleatoriamente, sobre qualquer assunto, como se fossem conhecidos desde o tempo de escola. O mais interessante é que o assunto encerrado, a condição de desconhecidos volta ao patamar inicial e cada um segue seu caminho. Uma pequena dose de conversa gratuita.

Mas uma coisa é alarmante no costume carioca, especificamente nos condutores do transporte pública amarelo conhecido como táxi, ou TX a moda carioquês. Existem três tipos de direção, a defensiva, comum a uma pequena parcela de motoristas, normalmente mais idosos, ofensiva, quadro geral da população brasileira e o modo motorista de taxi no Rio de Janeiro, também conhecido como método GTA de direção. Da vinda da rodoviária (centro da cidade) até aqui na Zona Sul, eu contei sete tentativas de derrubar motociclistas (uma por pouco não bem sucedida), quatro coladas na traseira alheia e pelo menos vinte fechadas enquanto brinca de corte e costura sem usar setas. E é claro, um aumento exponencial no meu acervo de xingamentos para o transito.

Existem alguns outros costumes cariocas clássicos, que mesmo sendo você de outra cidade ou estado, rapidamente se adéqua a esse. O clássico “aie, vamos marcar uma cerveja hein – vamos sim, te ligo” e a tal cerveja nunca acontece. Esse costume é tão costume que já faz parte da cultura carioca ao ponto que ninguém fica mais bravo ou dispensa tempo algum para explicações da ausência no tal encontro.

Como é comum na maioria das praias brasileiras, o Rio também compartilha do ideal de segregação social e estéticos para a escolha de qual deve ser o local a ser frequentado na praia, ou popularmente conhecido como o point (gíria essa usual desde o tempo em que minha avó era garotinha de Ipanema). Em minha ultima visita (quatro anos passados) o point ficava na praia de Ipanema, a famosa pela bela garota de Vinícius, entre os postos 09 e 10. Especificamente o 10 era a galera a favor da liberação política da Canabis e o 09 era os que apoiavam a diversidade sexual. Entre esses dois postos, lá se localiza toda a galera dedicada a vida social na praia, com seus corpos esculturais e papos vazios. Homens pombos como me explicou o meu carioca e bom entendedor dessas práticas sociais, primo Marquinhos.

Agora em 2012 alguns fatores moveram tal grupo estético e social para alguns postos a cima. Fator 01: Agora o metrô também vai a Ipanema, o que necessariamente leva os grupos sociais C e D para os postos 09 e 10. Fator 02: Devido a política em prol dos diretos dos homossexuais, o posto 09 se manteve como o local de encontro dos grupos GLS, com direito a bandeiras e sungas bem coloridas e beijos públicos, vitória para eles. Fator 03: Os usuários de maconha perderam seu espaço, tanto geográfico como político, pois o combate ao fumo (felizmente) aumentou e com isso os cigarros de maconha também entraram no hall do incomodadores públicos. 

Mas não há interesse em nenhum da classe média burguesa zona sul carioca em se unir ao pessoal “favelado” como dito no carioquês. Então eles migraram para o posto 12, na praia do Leblon, agora limpa graças ao Fator 04: Os últimos prefeitos têm feito um  intensivo trabalho de despoluição da Lagoa Rodrigo de Freitas, lagoa essa que desemboca na praia do Leblon. Então somados a esses e outros fatores modais que realmente são incompreensíveis o novo point é o Posto 12.  

No posto 12 sim, gente bonita para todo lado, com todo o arsenal estético e social necessário, óculos Rabiam no rosto (os mesmo que minha avó usava), biquínis e bermudões fabricados na china e etiquetados na Itália e seus celulares conectados das redes sociais para saber “qual é a boa da night”.

Mas o que mais me chamou a atenção nesse grupo específico está longe do padrão global de beleza, mas o costume noturno. Meu primo, como um bom anfitrião, me levou para o lugar mais badalado da cidade. Tratando-se de Rio de Janeiro, o esteriótipo da favela é mais que comum, e lá fomos nos, morro a cima. Na quadra do Santa Marta, ou Morro da Alegria. Devido a política de pacificação das favelas, hoje os morros cariocas são tranquilos e frequentados por todos. Uma expropriação do poder local e transferência do lucro diretamente para as milicias urbanas e Estado na verdade, mas com isso, todo playboy e patricinha da burguesia carioca pode realizar o sonho de subir o morro e dançar na escola de samba e manter o status de conhecedor das origens da cultura carioca. 

Curiosidade a parte, não havia na festa um integrante da população local do morro, apenas patricinhas e playboys extremamente bem vestidos. Preço para entrar, 50 reais por pessoa e cada cerveja a 7,00 reais. Final da conta de três pessoas que não consomem tanto 230,00! A pergunta fica, qual individuo, morador daquela localidade tem condição de pagar tanto por uma noite? E ainda mais importante, o quanto desse dinheiro fica realmente para a comunidade do Santa Marta? Vi ali policiais fortemente armados ( e jovens, teoricamente, para não repetir os vícios de seus antecessores ligados a prática da mesada do tráfico de drogas), vi bancos onde pude sacar o montante para aproveitar a minha noitada como um clássico burguês zona sul, mas não vi hospital ou escola.

Se o Rio de Janeiro continua lindo, é lógico que sim. Se vive nas ruas um clima de tranquilidade e paz como há muitos anos não se via, turistas se hospedam no Vidigal e a vista mais bela do réveillon não foi a de costumeira Copacabana, mas a da Favela da Rocinha, também pacificada, de onde os turistas e locais puderam contemplar todo o espetáculo da orla carioca. Mas ainda é necessário manter os olhos abertos, pois a pacificação a força está tirando os poderes locais e abrindo espaço para um novo tipo de organização, que não usa sandálias, mas terno e gravata. Torço de todo o meu coração para que a Cidade Maravilhosa possa viver em harmonia sempre, mas que para isso, toda a população carioca, do playboy zona sul ao morador do Santa Marta, possa viver também em harmonia e em boas condições!

Vídeo sobre a desocupação das favelas em prol das construções para as Olimpíadas e Copa do Mundo

                        Foto tirada da favela da Rocinha pacificada no Réveillon de 2012

                         Arte na areia, praia da Copacabana, Rio de Janeiro 2012 


domingo, 4 de setembro de 2011

2.5: O ano em que virei adulto


Colando grau em História pela UFSC

Como de costume ao somar mais um número em minha cronológica linha da vida, faço uma pequena e singela reflexão escrita sobre como foi o ano que passou, para quando estiver mais velho (bem mais) e minha memória já não tiver condições de sequenciar fatos e acontecimentos importantes, buscarei esses arquivos e textos, mantendo sempre um gancho com meu próprio passado.
Lógico que aos 60 e 70 tudo isso (caso ainda existe) será lido de uma forma muito mais romântica que hoje escrevo, mas ainda sim, servirá de ancora para minhas recordações.

Pois bem, os 25 anos:
Esse definitivamente foi o ano em que eu virei adulto, não vejo outra definição para esse ano que não essa. É bem provável que em dois ou mais anos eu me ache um tolo por considerar esse o ano adulto, mas hoje tenho reais motivos para acreditar que foi aos vinte e cinco anos de idade que fiz a passagem da vida jovem para a adulta.
Por exemplo, aos vinte e cinco anos eu me formei. (Foi ao vinte e seis na verdade, mas não conta, pois foi somente cinco dias depois de meu aniversário.) Foi aos vinte e cinco que entrei no cansativo processo da monografia, processo esse que tive pouca ou quase nenhuma orientação daquela que deveria me orientar, a não ser no primeiro encontro quando ela assinou o documento oficializando a orientação e no ultimo encontro minutos antes da apresentação perante a banca. Ou seja, li muitos livros, mais que deveria para uma monografia, mas o resultado final foram 120 páginas escritas e ilustradas e um 9,5 extremamente satisfatório.
Mas antes mesmo disso, percebi que estava em processo de transição, quando perdi totalmente o gosto pelas festas universitárias, normalmente composta por pessoas bêbadas e cerveja ruim e barata, mas muito divertidas. Festas essas que anos antes, somado ao Restaurante Universitário e a aulas de alguns professores específicos era o principal motivo de não querer sair da universidade nunca. Cada vez mais eu preferia beber menos cerveja ruim, ter menos barulho, conversar em voz mais baixa, resumindo, ficando velho.
Outro fator que contribuiu e muito para minha transição foi minha namorada, primeiro o fato de começar a namorar e sério, nada de “to contigo, mas to por aí”. Sério mesmo, de sairmos em casal para ver filmes suecos de casais homossexuais com problemas para adotar um jovem e depois ir a pizzaria conversar sobre filmes, artes e história.
A relação ficou tão séria que quando percebi estava lavando minhas roupas na casa dela e separando as minhas meias das dela. A mudança da vida de solteiro farreiro para namorado caseiro foi gradual e saudável, tanto que não sinto falta hoje da farra e durmo feliz ao lado dela todos os dias. Meus programas mudaram, são geralmente pizzas, sushis, cinemas, teatros, pipoca (e muita pipoca) com DVDs debaixo das cobertas. Alguns programas foram somados com a presença dela, como passear com o Thor aos domingos pela beira mar ou ir escalar nas sextas-feiras à noite.
Outro fator que contribuiu e muito para minha transição foi o número de aulas e turmas (e conseqüentemente provas e trabalhos) ter aumentando exponencialmente. Sou agora oficialmente um professor de História, formado pela Universidade Federal de Santa Catarina. Atualmente trabalho em três escolas, duas dessas extremamente conceituadas aqui em Florianópolis.
O aumento de turmas gera também o aumento salarial, o que é maravilhoso e fundamental para a transição, pois quando estudante, eu sempre estava lascado por não ter grana, segurando daqui, apertando dali, comia e jantava no RU para ter mais grana no fim do mês e por aí ia. Agora com o maior salário, posso me dar ao luxo de sair sem me preocupar tanto, lógico que estou longe de nunca mais me preocupar com dinheiro, afinal, não ganhei na mega-sena ainda. Mas que agora as coisas estão bem mais aliviadas, ah estão!
Alguns sonhos da juventude não mudaram, mas agora posso pensar realmente em fazer a minha viagem e ir a Cuba e depois descer pela América Latina de moto, jipe, mula... 
Ah sim, foi aos vinte e cinco que nasceram meus primeiros cabelos e barbas brancas, o que sinceramente achei muito injusto de minha genética, pois minha barba ainda é falha e cheia de defeitos como a de um garoto, mas já apresenta fios brancos e loiros (potencialmente brancos e alguns anos). Quanto ao meu cabelo, a calvície genética também se manifestou mais aos 2.5, também não curti muito, ainda tenho muito apego a minha antiga juba de leão.
Mas o pior mesmo foi o rápido desenvolvimento de uma barriguinha. Lesionei o ombro escalando no início do ano e tive de parar de treinar tudo por pelo menos oito meses, fora que ao final da fisioterapia, acupuntura e reza brava para curar tal ombro, entrei na temporada TCC e me afundei em livros, café, chocolate e cobertores, só parando para trabalhar, namorar um pouco e dormir (as vezes).  Logo, meu corpo ganhou alguns bons Kgs (oito ao total) e desenvolvi uma localizada barriga. Barriga essa que estou me esforçando para perdê-la novamente, pois voltei a treinar (bem leve) e agora com uma companheira o que deixa o treino ainda melhor.
Bom, prova máxima da saída de minha vida universitária jovem para a adulta é que ontem fui a uma festa, jantar de aniversário de minha coordenadora. De lá, voltei não eram nem meia noite e agora tenho de me arrumar para almoçar em um domingo com meu sogro e sogra.

Mas sabe que eu to feliz assim, sendo adulto!

domingo, 28 de agosto de 2011

Discurso da Formatura de História UFSC


Boa noite a todos os presentes, autoridades e colegas...
Em primeiro lugar, queremos agradecer àqueles que, de alguma forma, sempre estiveram ao nosso lado durante essa caminhada e que fizeram dos nossos os seus objetivos. Esta alegria hoje comemorada, devemos a vocês, pais, que não mediram esforços para que isso tudo se tornasse possível.
Nós duas que estamos aqui nesta Tribuna permanecemos por alguns boooons anos nesta Universidade...
Assistimos a várias formaturas... de História, dos nossos colegas das Ciências Humanas, e também de outros cursos dos mais diversos centros.
Passamos a graduação desnaturalizando as comemorações e as cerimônias, e analisando os discursos. E agora, estamos aqui seguindo esse mesmo padrão...
O conceito de formatura muito semelhante ao termo latino, se aproxima muito do significado de padronização.
“Formatura” tem parentesco com as palavras “formatar”, “formatado”, /fôrma/..
Então, se você está se formando hoje pode significar que você entrou na /fôrma/, foi formatado...
Falando em formatação, já aviso aos colegas que ainda não fizeram o TCC que agora o tamanho não é mais o do papel A4... agora o TCC tem que caber em papel A5... segundo as indicações da biblioteca universitária.
Formatar é, portanto, padronizar! Talvez por isso tantos alunos geniais abandonem os mais diversos cursos de graduação... quem sabe eles sejam grandes demais para caber em uma forminha...
Nós, apesar de nos sentirmos ‘formatados’ nesta roupinha padronizada, estamos contentes de estar aqui falando o que pensamos ...
Estaríamos equivocados se falássemos sobre as noites em claro que os alunos desta turma passaram estudando para as provas, ou qualquer coisa desse blá blá blá padronizado. Ou, ainda, se inventássemos ou forjássemos tradições para esta turma, só para agradar aos ouvidos de todos os presentes.
Aliás, aproveitamos para falar que aqui não temos uma turma e sim 17 alunos soltos que se conheceram apenas de vista ou ficaram amigos nas festas ou nos bares. Apesar disso, estamos cientes de que seremos futuros colegas de profissão e possivelmente poderemos nos esbarrar em diversas situações.
O fato é que, por conta da diversidade não contemplada nas cerimônias de formatura, muitos alunos do curso de História não participam desse tipo de evento.
Fica, nesse sentido, a reflexão do por que será que tantos alunos abdicam deste momento e decidem colar grau em gabinete...
Apesar de toda nossa crítica, estar aqui hoje representa um privilégio.
Primeiro, o de termos entrando em uma Universidade.
Segundo, o de termos estudado em uma Universidade Pública.
E, terceiro, o de termos conseguido nos ‘formar’ nesta universidade.
Ser um privilegiado significa que você tem algo que a maioria das pessoas não têm: o acesso ao ensino superior público e gratuito. Então, será que podemos ter a alegria plena desse privilégio?
O curso de História nos fez ter a noção de que não podemos nos contentar em passar a vida reclamando do problema educacional deste país, mas sim que devemos arregaçar as mangas e fazer algo de concreto no sentido de modificar esta realidade, mesmo que isso signifique abdicar de um futuro farto e confortável.
Por isso, senhores pais, por favor, não lamentem que a carreira de seus filhos não aponte para um futuro materialmente farto.
Senhores professores, magnífico reitor, por favor, não utilizem o tempo de seus discursos para procurar alternativas para a pobreza que aparentemente bate à nossa porta.
Amigos de outras áreas, não nos olhem com pena...
Há entre os alunos de História pessoas que renunciaram a empregos públicos, pessoas que abandonaram cursos de Direito e até mesmo de Engenharia...
Não somos coitados. Abdicamos das tais “melhores opções” pelo desejo sincero e verdadeiro de fazermos o curso e nos tornarmos professores ou pesquisadores de História. 
Além disso, pelo fato de que, acima de tudo, acreditamos em uma educação pública e de qualidade, sem enchermos a boca para falar neste discurso.
Pois, mesmo sabendo de todos os problemas pelos quais um professor passa em sua profissão, ainda assim escolhemos esse ofício.
O fato é que hoje é um dia de muita alegria. É um momento muito esperado e significativo para quem teve a perseverança de passar 4, 5, 6 ou mais anos dentro desta universidade, insistindo neste diploma.
Por isso, pedimos a todos os presentes que entendam que algumas pessoas têm a compreensão de que a felicidade não é diretamente proporcional ao tamanho da conta bancária.
Somos extremamente críticos e reflexivos, por isso peço em nome de todos os estudantes de história, não nos meçam com vossa régua, não nos pesem com vossa balança. Conhecemos bem as amarras desse sistema opressor, autoritário e desumano. Nosso sistema de pesos e medidas é outro. Temos outros valores.
Somos historiadores! E estamos muito contentes com isso!!!

Pelas colegas Denize Gonzaga Santo e Eloisa Rosalen