quarta-feira, 9 de março de 2011

Amor e posse


“O amor é egoísta”, foi o que me disse a mãe preta quando perguntei a ela sobre o amor.
Pensei muito naquela frase, por dias eu pensei, questionando, refutando, argumentando e contra argumentando seguidas vezes em minha mente.
Como pode ser o amor algo tão mesquinho como o egoísmo?
Perguntei a um amigo lingüista sobre a palavra egoísta; ele me explica que a palavra tem como uma de suas bases a alusão ao ego. Ego, localidade na mente onde ficam os desejos da alma, desejos por vezes tão ocultos que nem mesmo Freud poderia desenterrá-los.
Busco em Dante os desejos e sentimentos mais hediondos que a mente pode produzir. Sexo, vaidade, dor, tortura, morte, posse. Eis minha vilã. A posse.
Na cultura ocidental de um modo geral a posse é comumente confundida com a própria essência do ser. Ato este totalmente compreensível ao tratar de uma sociedade individualista em que os conceitos de posse e poder estão diretamente emaranhados. Mutualístico pode-se dizer. Mas ainda existem correntes que conseguem separar o ser das posses ou poder que estas representam.
Busco por uma definição do ser novamente na lingüística. Ironicamente no inglês a mesma palavra que é utilizada para a conotação ser, também tem serventia de igual valor quando usada na conotação de estar. É possível ser e estar ao mesmo tempo? “ eu estou com fome” é totalmente diferente de “eu sou a fome”. Na primeira sentença a fome pode ser facilmente sanada com um prato de comida, porém na segunda sentença não há cardápio no mundo que mude tal situação, posso concluir que o ser é imutável? Sendo esse o caso, o amor é e sempre será egoísta?
Para os que amam é necessária a posse do objeto amado? E esse amor é representado pelo sexo, pela dor, pela paixão ou mesmo pela vaidade? É o amor que se transforma em dor quando há partida ou desilusão?
Em algumas filosofias orientais a perda é parte crucial do aprendizado árduo e é somente após anos de aprendizado que se alcança o verdadeiro amor. Puro e sem interferências dos sentimentos ou paixões. O amor está no ato de contemplação da vida, pura e simples. Agradecer pelo momento vivido e continuar a contemplação das várias esferas da própria vida.
Talvez no ocidente seja preciso rever alguns conceitos básicos, começando pela vilã em questão, a posse. No ocidente, posse significa eternidade, algo somente pertence a alguém se este bem (normalmente físico) foi somente desta pessoa e por todo o tempo. Até mesmo pessoas são possuídas e possuidoras de outras. Ao falarmos “meu marido, minha namorada, meu pai, minhas amigas...” limitamos a pessoa em questão a algo que nos pertence, que está diretamente ligado a nós.
O apego é a prova máxima do amor ocidental. Agora faz todo sentido na verdade: “o amor é egoísta”, lógico! O apego está diretamente ligado a posse. De alguma forma, quando se ama alguém (ou alguma coisa) e se apega a este ser, não há vontade de deixar partir, perder ou mesmo dividir, pois sendo o amor egoísta, ele possui a pessoa e sendo ela uma posse, deve permanecer enquanto existir o amor, que deve durar para sempre (como todas as construções de um ideal romântico de eternidade dos atos e memória)
Talvez se fosse possível o amor não estar ligado à posse, ou pelo menos, não ao ideal de que a posse deve ser eterna para se caracterizar com válida e existente. Talvez assim houvesse o amor tal quais os orientais escrevem sobre, contemplação do momento, gratidão pela existência e pela duração e abertura para novos momentos e aprendizados. 


Imagens: 
"Love" artista desconhecido, foto do google!

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